Mulheres que lideram o Agro em Goiás relatam preconceitos e machismo

08 março 2025 às 10h13

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Deivianne Jhasper
A presença feminina no agronegócio cresce ao longo dos anos, em um setor onde o machismo ainda é presente. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, mais de 31% das propriedades rurais do país eram lideradas por mulheres. Em Goiás, dos 121 sindicatos rurais existentes, apenas 10 têm mulheres na presidência.
No norte de Goiás, Ana Amélia Paulino se tornou a primeira mulher a presidir o Sindicato Rural de Porangatu em 50 anos de história. À frente de um dos maiores sindicatos do estado, ela destaca os desafios de liderar em um setor tradicionalmente masculino. “Um dos maiores desafios que enfrentei e enfrento até hoje como presidente do sindicato é a mudança de posicionamento da entidade. Nós, como mulheres, temos uma nova visão, voltada para crescimento e tecnologia, e enfrentamos essa quebra de paradigma”, explica.
Ela reconhece que o machismo estrutural ainda existe, mas enxerga avanços. “O que vejo mais são as mudanças de visão que nós, mulheres, temos. Nossa abordagem é mais ampla, mais integradora, buscamos um crescimento conjunto”, afirma. Sob sua liderança, o Sindicato Rural de Porangatu reformulou suas principais feiras, tornando-as mais interativas e acessíveis ao público. “Depois de 30 anos, abrimos os portões do parque de exposições. Trouxemos a vivência do agro para todos, com cultura, negócios e tecnologia. Além disso, criamos espaços exclusivos para mulheres, com palestras e conhecimento voltados para elas”, detalha.

Sobre a presença feminina no agronegócio, Ana Amélia encoraja outras mulheres a ocuparem esses espaços. “Se você quer chegar à presidência de um sindicato ou empreender no agronegócio, vá em frente. Lugar de mulher é onde ela quiser”, afirma.
Preconceito e superação no Agro
A presidente do Sindicato Rural de Itajá, Fabrizia Borges, é também primeira mulher no cargo. Ela relata desafios no início de sua gestão. “Vivi preconceito por ser a primeira mulher nesse cargo. Mas, aos poucos, com meu comprometimento, fui conquistando meu espaço. A única diferença entre homens e mulheres no agro está na força física, porque no mais, somos igualmente capazes”, enfatiza.
Em Alexânia, há 119 quilômetros de Goiânia, Geni Ribeiro, presidente do Sindicato Rural da cidade, ressalta a importância da participação ativa das mulheres no setor. “Muitas mulheres não querem se envolver no agro, mas quando entram, percebem o quanto podem contribuir. Eu mesma fui estudar, fiz cursos técnicos de ordenha, manejo, nutrição, e comecei a gostar cada vez mais dessa atividade”, conta.
Ela também enfrenta desafios para engajar os produtores rurais no sindicato. “O produtor rural tem uma rotina muito ocupada. Meu maior desafio é trazê-los para dentro do sindicato, criar rodas de conversa, cafés e debates sobre os temas do momento, como a alta do boi e a queda da soja. Quero que o sindicato seja a casa do produtor, onde ele busque suporte e negociações”, explica.

Desafios e representatividade feminina
Alzira de Fátima, presidente de um sindicato rural fundado em 1951, é a primeira mulher a ocupar o cargo na entidade, historicamente dominada por homens. “Os principais desafios que encontrei foram fazer com que as pessoas acreditassem que a mulher tem potencial para desempenhar um bom trabalho dentro de um sindicato”, relata.
Alzira também destaca a necessidade de inovação. “Nossa pecuária ainda não tem tanta tecnologia como em outras regiões. Estamos em um momento de crescimento e transformação, trazendo cursos e projetos para que os produtores possam se desenvolver”, explica. Entre suas conquistas, está a criação de uma base dentro do parque de exposições da cidade, fortalecendo a estrutura do sindicato.

Margareth Alves Irineu, presidente do Sindicato Rural de Araguapaz, também enfrentou resistência ao assumir o cargo. “As mulheres presidentes são tratadas de forma diferente devido ao estereótipo de gênero. Existe a expectativa de que sejamos mais emocionais ou menos aptas para lidar com pressão”, destaca. Além disso, a baixa representatividade feminina nos sindicatos é um obstáculo. “Na nossa federação, somos menos de 7% das presidentes. Há muita cobrança sobre aparência, comportamento e a constante desqualificação de lideranças femininas”, afirma.
Apesar das dificuldades, Margareth se mantém firme. “”Os desafios existem, mas isso só me motiva a ampliar nossa representação feminina na esfera do poder”, ressalta. Entre as ações promovidas pelo sindicato, estão capacitações para produtoras rurais, consultorias técnicas e incentivos para acesso a crédito. “Focamos na presença feminina, porque quando uma mulher se engaja, ela traz o parceiro junto. Isso fortalece nossa representatividade”, afirma.
Liderança feminina no campo
Rosa Maria Machado, presidente do Sindicato Rural de Cavalcante, também precisou enfrentar um ambiente predominantemente masculino. “Ainda há muita discriminação contra mulheres que assumem papéis de liderança no meio rural. Mas encontrei apoio na federação para seguir em frente”, conta.
Entre suas principais bandeiras está a regularização fundiária, um desafio crítico na região, além do apoio a mulheres do campo que frequentemente são esquecidas pelo poder público. “Capacitar e orientar essas guerreiras rurais é fundamental. Nossa presença nesses espaços é necessária para trazer pautas que os homens, muitas vezes, não enxergam”, afirma.

Luana Oliveira, presidente do Sindicato Rural de Buriti Alegre, também precisou superar barreiras ao assumir o cargo. “Ganhar a confiança dos membros foi um grande desafio, pois a tradição pesa muito. Precisei demonstrar minha capacidade de liderança e tomada de decisão”, revela. A dificuldade de equilibrar as demandas do sindicato, o trabalho na fazenda e a vida pessoal também é uma realidade. “A gestão do tempo se tornou essencial”, diz.
Entre as conquistas de sua gestão, Luana destaca o aumento do número de filiados por meio de estratégias de marketing e maior divulgação dos cursos oferecidos. “Antes, não havia divulgação em redes sociais, e hoje conseguimos aumentar significativamente a participação”, relata. Além disso, ela criou a primeira unidade da FAEG Jovem em Buriti Alegre, formando futuros líderes do setor.
Para as mulheres que desejam ocupar cargos de liderança no meio rural, Luana deixa um conselho: “Acreditem em si mesmas. Busquem conhecimento, formem redes de apoio e não tenham medo de propor mudanças. Liderança é sobre servir e inspirar, e cada conquista abre caminho para outras mulheres no futuro”, disse.