De férias com esposa, goleiro do Canadá rebate ódio de torcida da Croácia com "trator do amor"

Milan Borjan foi alvo de provocações com faixas e cânticos que remetiam a massacre e expulsão de habitantes da região em que nasceu. Resposta a hostilidades veio com sorrisos na piscina

Por Redação do ge — Rio de Janeiro

 


O Canadá foi eliminado da Copa do Mundo na primeira fase, mas o goleiro Milan Borjan, já de férias, não esqueceu as provocações de que foi vítima no duelo com a Croácia. Em resposta a faixas e cânticos da torcida croata, Borjan postou registro nas redes sociais em uma piscina de água cristalina, feliz da vida junto à esposa, Snezana.

Na legenda, rebateu o ódio alheio com amor: " Na nasem traktoru pise LJUBAV" ou "Está escrito AMOR em nosso trator", em tradução livre. Borjan desabilitou comentários na postagem.

De férias após Copa, Borjan e esposa celebram o amor em publicação nas redes sociais: resposta ao ódio da torcida croata — Foto: Reprodução Instagram
De férias após Copa, Borjan e esposa celebram o amor em publicação nas redes sociais: resposta ao ódio da torcida croata — Foto: Reprodução Instagram

A referência ao "trator" feita por Borjan diz respeito a uma faixa estendida no estádio Internacional Khalifa, na vitória da Croácia por 4 a 1 sobre o Canadá. Torcedores croatas escreveram "Knin 1995 - Nada corre como Borjan" sobre a bandeira de uma empresa de tratores. "Correr" diz respeito à fuga do goleiro, aos 8 anos, de um grave conflito.

Knin é hoje uma cidade da Croácia, local onde Borjan nasceu, em 1987. No entanto, o goleiro é de etnia sérvia, população bem presente em Knin na época, e não se reconhece como croata. Em meio à "Operação Tempestade", última grande batalha da Guerra de Independência da Croácia, Borjan fugiu da cidade com a família, em 1995, com destino a Belgrado, capital da Sérvia, e depois imigrou para o Canadá.

Durante o caos de guerra, muitos sérvios de Knin foram mortos ou expulsos da região, e o veículo utilizado para transportá-los era justamente o trator.

Torcida croata provoca o goleiro canadense Borjan com faixa em alusão a limpeza étnica de 1995, ocorrida na cidade em que atleta nasceu — Foto: Reprodução / Kurir
Torcida croata provoca o goleiro canadense Borjan com faixa em alusão a limpeza étnica de 1995, ocorrida na cidade em que atleta nasceu — Foto: Reprodução / Kurir

Fifa puniu a Federação de Futebol da Croácia pelas atitudes hostis de sua torcida naquela partida. O caso foi enquadrado no artigo 16 do Código Disciplinar da Fifa, que diz respeito ao uso de palavras e objetos para transmitir mensagens políticas. A multa é de 50 mil francos suíços, valor equivalente a R$ 277.905,00.

Entenda melhor o caso

Borjan nasceu na hoje cidade croata de Knin, em 1987, mas já afirmou diversas vezes que nasceu na República Sérvia da Krajina, que em 1991 se proclamou independente dentro da própria Croácia em meio à dissolução da antiga Iugoslávia, apesar de não ter sido reconhecida internacionalmente. O jogador do Estrela Vermelha, da Sérvia, não se reconhece como croata.

De etnia sérvia, Borjan fugiu da região com os pais em 1995, primeiro para Belgrado e depois tendo imigrado para o Canadá em meio à chamada “Operação Tempestade”, que expulsou da região mais de 250 mil sérvios e matou mais de duas mil pessoas, a maioria civis.

Goleiro Borjan e ala Alphonso Davies após derrota do Canadá para a Bélgica — Foto: REUTERS/Siphiwe Sibeko
Goleiro Borjan e ala Alphonso Davies após derrota do Canadá para a Bélgica — Foto: REUTERS/Siphiwe Sibeko

No estádio, uma bandeira levada por torcedores croatas fazia referência ao evento de 1995. A bandeira de uma empresa de tratores - em alusão ao fato de os sérvios deixarem Krajina em tratores após uma das maiores limpezas étnicas em solo europeu - trazia escrito por cima os seguintes dizeres: “Knin 1995 - Nada corre como Borjan”, criticando também o fato de o jogador e sua família terem deixado o país. Em Knin hoje restam menos de 10 mil sérvios.

Os croatas continuaram a provocar Borjan gritando também: "Vukovar, Vukovar". O grito era uma referência à Batalha de Vukovar, um cerco de 87 dias à cidade de Vukovar, no leste da Croácia, onde o Exército Popular da Iugoslávia, apoiado por forças paramilitares da Sérvia, combateu o exército croata, em 1991.

A imprensa sérvia repercutiu o episódio e cobrou providências da Fifa e punições à seleção croata, que acabaram acontecendo dias depois.